Diante do sol, em uma
tarde típica de verão, sentado à beira mar, olhando o horizonte e contemplando o
pôr-do-sol, me deparei com a questão: Se tudo vier do acaso, por que existe o
sofrimento? Se tudo for criado por um ser superior, por que existe não existe
somente alegria? Qual pai ou até mesmo criador, não cuida de sua criação? Então
comecei a organizar a caixa da minha vida, todas as experiências por ordem
cronológica e de importância. Olhei para o céu e eis que vi duas aves voando
sem destino, pareciam brincar. Como dois amantes correndo na areia junto ao mar,
elas voavam de um lado para outro, usufruindo do ar quente e do vento, então me
perguntei: Se tudo for criado pelo acaso, de onde vem a alegria, Sentimento antônimo
à tristeza e sofrimento?
Voltei à minha caixa,
imensamente desorganizada e me ative a um ponto e alguns itens. Infância e
Adolescência, Nascimento e Criação. Quando observei mais atentamente, pude ver
quão desorganizado foi o processo. De quem é a culpa? Quem responsabilizaria
por tanta bagunça nesta caixa tão pequena? Aliás, quem me deu esta caixa?
Se tudo nascer do
acaso, de onde venho eu? Será que sou personagem de uma peça teatral que tem
hora marcada para acabar e fechar as cortinas? O que fica por trás das
cortinas? Quando encerra o espetáculo e as luzes acendem, o que permanece por
trás das cortinas fechadas? Ao ver a quantidade de itens contidos na caixa,
penso: ainda falta muito para as cortinas se fecharem. Este pensamento da duração da peça, duração do ato, duração da fala, duração do
silêncio é inquietante, me tira do sério pensar que não sou protagonista da peça que foi
escrita para mim, e na maior parte do tempo, não foi nem mesmo ensenada por
mim. Vejo no fundo da caixa um livro, livro este com o título: Minhas Falas, e
na parte inferior da capa tem escrito: por
mim, ao folhear o livro observo branco em todas as páginas. Será que meu
personagem não diz uma palavra? Será que não ensena em nenhum momento? Foi
então que surgiu o pensamento: Se tudo vier do acaso, por que minhas falas não
são redigidas por mim? Por que meus atos são dirigidos e escritos por outrem?
Quem os escreve?
Se tudo deixar de vir
do acaso, o que seria do futuro? O que seria da fluidez do tempo e da
contemporâneidade? Se tudo já for previamente escrito, por que ninguém tem
acesso ao final de cada ato, de cada cena, de cada peça teatral vital? O que
aconteceria ao acaso, se o final do livro fosse revelado? Assistiria, você, a
um filme que o final já é conhecido, como se fosse surpresa o seu final?
Se tudo deixar de
nascer do acaso, o que seria do livre arbítrio? O que seria da livre escolha? O
que seria da surpresa?.
Olho então para a caixa
e quando estou para fechá-la, um senhor, muito idoso, e joga todos os itens
ao chão, bagunçando-os tudo novamente, e eu olho pra ele desesperado e digo: “Por que comigo? Não estão tantas pessoas
olhando, organizando e fechando suas caixas?” – Ao que ele me diz: “Você tem muito o que aprender com cada item
que há nesta caixa, e a tua caixa ainda está vazia.” Após ter entendido o
que ele disse, o agradeci e voltei a examinar item a item da minha caixa, ainda
muito vazia.